quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012
A mineira calada
Aninha
é uma mineira calada que trabalha aqui em casa. E quando fala, vem aquela voz
abafada. Raramente fala. Eu, que nunca tive empregada chamada Aparecida, cada
vez que vou chamar Aninha, só me ocorre chamar Aparecida. É que ela é uma
aparição muda. Um dia de manhã estava arrumando um canto da sala, e eu bordando
no outro canto. De repente ― não, não de repente, nada é de repente nela, tudo
parece uma continuação do silêncio. Continuando pois o silêncio, veio até mim a
sua voz: “A senhora escreve livros?” Respondi um pouco surpreendida que sim.
Ela me perguntou, sem parar de arrumar e sem alterar a voz, se eu podia
emprestar-lhe um. Fiquei atrapalhada. Fui franca: disse-lhe que ela não ia
gostar de meus livros porque eles eram um pouco complicados. Foi então que,
continuando a arrumar, e com a voz ainda mais abafada, respondeu: “Gosto de
coisas complicadas. Não gosto de água com açúcar.”